Foi boa a chuva. serviu de pretexto para não sair do café. é bom quando há coisas que obrigam o corpo a não ter de decidir, cansado. A render-se, sem pensar na luta. O cansaço. A fraqueza. Penso. O homem não viu a luz - os iluminados são sempre os outros... é o que se aprende. Vai sempre dar ao mesmo.
O cansaço, a fraqueza. E depois? Que mal tem recusar o brilho? Onde está o erro de não querer pensar em nada? Onde acaba a verdade do silêncio?...penso. Chove tanto. E serve para tanta coisa. serve para dizer sim, triste. sim, um pouco fria. os pés frios, sobretudo. e as mãos. As minhas mãos e os meus pés são mais iluminados que eu. merda, não é? e não, não sou eu que mando. Foi a chuva.
A gente triste, encolhida nos fatos bons de fim de semana. a gente triste que chama os filhos para rirem todos. A gente já não ri sozinha. penso....mas somos todos tão mais tristes pelas ruas, não é? e o corpo já nem me pede nada, de tão iluminado que está. já não pede nada... e eu peço-lhe tanto.... Eu peço cada vez mais... A vida devia ter banda sonora... em certos momentos, era como nos livros - a descrição dos cheiros e do vento no cabelo. era como nos filmes - a luz perfeita para o que se quer. a música a começar e a acabar connosco. Sim, podia ser música com letra...sim, a poesia a acabar connosco. Mas bastava uma melodia só.
Chove tanto contra o vidro...que pressa de entrar. também quero essa fúria de me apresentar contra as coisas... ou então a velha imagem... o louco na chuva. bem...vendo bem...não precisa de ser louco (essa mania de pôr loucos em tudo....como se soubessem). E então começava a música..uma música recortada e húmida, seja lá isso o que for...penso.
Vem-me o mar aos olhos, a praia. um dia de inverno e de sol azul solene. mas a máquina do café faz tanto barulho... é...estão todos aqui. todos e eu... que se fodam os artistas todos que deixam os lábios secar, para se contemplarem com a imagem do sangue a fugir das feridas.
Ainda bem que está a chover. Uma iluminação de chuva. E eu não preciso de falar.
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